domingo, 13 de novembro de 2011

 
O tempo pergunta ao tempo, 
quanto tempo o tempo tem. 
O tempo responde ao tempo 
que o tempo tem tanto tempo,
quanto tempo o tempo tem.

quarta-feira, 9 de novembro de 2011

A Fonte da Moura, em Alpedriz (Alcobaça)






Da lendária ocupação árabe apenas ficou a lenda da “Fonte da Moura”. Situada numa propriedade particular a referida fonte é uma nascente de água, ligada ao chamado rio da Loureira. Segundo a lenda, uma Moura ia ali buscar água arranjando pretexto para se encontrar com o namora­do e terá ficado ali “encantada” vendo a água correr e certamente a pensar nas delícias do futuro, quando o povo a que pertencia foi atacada e tudo foi desfeito.

A moura de Cidagonha


Na aldeia de Moimenta, concelho de Vinhais, há um lugar com sinais de antigas fortificações conhecido por Cidagonha, e a que o povo também chama “cidade dos mouros”. Diz a lenda que vivia ali uma princesa mourisca encantada que, ora aparecia a pentear os seus cabelos com um pente de ouro, ao luar, ora a tecer num tear de ouro, cujo bater compassado dos pentes na teia e o ruído dos pedais poderiam ouvir-se na povoação em noites calmas. Outras vezes poderia ouvir-se a referida princesa cantar melodiosas canções de saudade, cujas palavras não seriam perceptíveis.
Segundo a lenda, o tesouro seria constituído pelo tear, o pente e muitos outros utensílios e jóias da princesa, incluindo um manto, tudo em ouro. Mas tratando-se de um tesouro encantado, este só poderia ser descoberto por pata de ovelha e ponta de relha.

Fonte: MARTINS, João Vicente – Moimenta da Raia – uma aldeia
comunitária em evolução e mudança, Braga, Ed. Autor, 1995, p. 83

A cisterna da Torre de Dona Chama




No castelo da Torre de Dona Chama [concelho de Mirandela] há uma cisterna com uma moura encantada em mulher da cinta para cima e serpente da cinta para baixo. Uma vez passou por ali um homem, e a moura chamou-o e disse-lhe que fosse lá ao outro dia desencantá-la, e que não tivesse medo, porque ela nesse dia apareceria toda serpente, mas o homem ficaria rico. O homem foi. Quando a serpente ia a subir pelo homem acima, a dar-lhe um beijo na boca, assim que chegou à garganta, este intimidou-se e atirou-lhe com o casaco. A serpente enroscou-se, fugiu e exclamou:
– Ah! Que dobraste o meu encanto!
Ainda assim ela mandou ao homem que a certas horas fosse lá a um lugar, onde acharia uma pedra com doze vinténs, todos os dias. Nessa cisterna, na manhã de S. João, ouve-se um tear a trabalhar.

Fonte: VASCONCELLOS, J. Leite – Contos Populares e Lendas,

terça-feira, 8 de novembro de 2011

Este Silêncio - Camané



Há um silêncio pesado
Que não sei de onde é que vem
Nem sei se lhe chamam fado
Ou que outro nome é que tem

Se canto, não me dói tanto
O coração magoado
Mas há em tudo o que canto
Este silêncio pesado

Não é mágoa nem saudade
Nem é pena de ninguém
O silêncio que me invade
E não sei de onde é que vem

Silêncio que anda comigo
E que mesmo sem eu querer
Diz através do que eu digo
O que eu não posso dizer

Este silêncio pesado
Que me suspende e sustém
Não sei se lhe chamam fado
Ou que outro nome é que tem

Se com palavras se veste
A alegria e o pranto
Então que silêncio é este
Que há em tudo o que eu canto

mãos que fumam, fumam...


Brandas e Inverneiras - Lã


Nas Serras do Soajo e da Peneda existe um tipo de povoamento muito típico: as Brandas e Inverneiras.
São núcleos habitacionais temporários cuja origem se prende com a necessidade das populações utilizarem os pastos localizados na serra para alimentar o gado. Este processo de transumância tem a ver com a garantia de alimentos e, consequentemente, com a sobrevivência humana.
A Inverneira, como o nome indica, é a aldeia onde a família passa o Inverno. Localizam-se em vales, ou seja, em altitudes baixas. No princípio do Outono, as pessoas descem para a Inverneira permanecendo aí até Março. Nessa altura, sobem para a Branda, onde se fazem as sementeiras e onde se passa a maior parte do ano. Hoje em dia, nas poucas aldeias que mantêm a tradição, as pessoas apenas levam os animais e alguns haveres, ao contrário de antigamente, em que as pessoas levavam até a mobília.
As Brandas e Inverneiras são, sem dúvida, um elemento importante da cultura da população deste Território.


fotografias de Jorge  Barros
GERÊS - AQUI

domingo, 6 de novembro de 2011

mãos que partilham, mãos que recebem...

A Fonte do salgueirinho




A Fonte do Salgueirinho tem sido considerada um romance popular moderno devido à sua limitada distribuição geográfica e à falta de versões antigas. Contudo, como demonstro neste trabalho, evidência interna de carácter literário, linguístico e folclórico sugere que, na realidade, o poema é bastante antigo. A fonte como ponto de encontre para os amantes e a utilização eufemística de palavras como "cântara," "roca," "sarilho," "barbeiro," "lanceta," "sangrar," "veia" e "picada" eram correntes na Idade Média e no Renascimento. Essas metáforas aparecem frequentemente na poesia cortesã, em poesia francamente erótica, e noutros tipos de poesia antiga. Como alguns destes eufemismos já não se usam nem se entendem bem, o poema não pode constituir uma composição moderna. Por conseguinte, neste caso a tradição oral moderna suplementa, uma vez mais, o nosso conhecimento do passado, conservando-nos um velho poema que, caso contrário, nos seria completamente desconhecido. 

A Fonte do Salgueirinho


Né Ladeiras - A Fonte do Salgueirinho (voz de Adélia Garcia)

entre mãos...






Eugénio de Andrade - Coração Habitado

Aqui estão as mãos.
São os mais belos sinais da terra.
Os anjos nascem aqui:
frescos, matinais, quase de orvalho,
de coração alegre e povoado.

Ponho nelas a minha boca,
respiro o sangue, o seu rumor branco,
aqueço-as por dentro, abandonadas
nas minhas, as pequenas mãos do mundo.

Alguns pensam que são as mãos de deus
— eu sei que são as mãos de um homem,
trémulas barcaças onde a água,
a tristeza e as quatro estações
penetram, indiferentemente.

Não lhes toquem: são amor e bondade.
Mais ainda: cheiram a madressilva.
São o primeiro homem, a primeira mulher.
E amanhece.

Eugénio de Andrade

quarta-feira, 2 de novembro de 2011

aos presentes e aos ausentes ...













1 e 2 de Novembro, práticas e costumes

Práticas Alimentares

Autores há que defendem constituírem as duas celebrações do dia 1 e dia 2 uma única festa, expressa e directamente ligada ao culto dos mortos.

Nas festividades de Todos os Santos, de Finados ou dos Fiéis Defuntos - e noutras comemorações de carácter cíclico ou pontual, religiosas ou profanas - vamos encontrar reminiscências de celebrações mágico-propiciatórias, de purificação ou profilácticas praticadas pelos nossos antepassados, representando, por sua vez, também elas resquícios de cultos naturalistas de deuses ou espíritos da vegetação, mais remotos ainda, tendo por objectivo o apaziguamento e a debelação do mal ou a procura da fertilidade e da abundância.

Na aldeia de Benquerença (Castelo Branco), no dia de Todos os Santos, faziam-se as tradicionais «papas de milho» ou de «carolo», comidas neste dia a hora da merenda ou à sobremesa. Manjar cerimonial desta data, as papas oferecem aos amigos ou familiares que apareciam como visita ou a quem passava, ocasionalmente, em casa de cada de cada um.

As papas de milho aparecem também no Alto Alentejo, caso de Arronches (Portalegre), onde lhes juntam passas, nozes e castanhas, e de Castelo de Vide, em que lhes adicionam açúcar e mel, enquanto no Algarve tomam o nome de «xarém».

Em Castelo de Vide o milho destinado às papas tradicionais deste dia era obrigatoriamente moído nas «zagarelhas» (moinhos manuais).

Em Aveiro, em vez de milho, as papas são feitas de abóbora-menina, costume que só neste lugar se verifica, conquanto confeccionadas especialmente para o dia dos Fiéis Defuntos.

No distrito de Bragança (Trás-os-Montes), antigamente, no dia 1 de Novembro os rapazes comiam dois chibos, um deles oferecido pelos próprios rapazes, o outro pelas raparigas.

Também na aldeia de Cidões (mesma região) é tradição antiga, na noite de 31 de Outubro para 1 de Novembro, os habitantes reunirem-se numa refeição conjunta, tendo por prato cerimonial a carne de cabra. Nas mesas improvisadas ao ar livre, além da abundância de vinho, comem-se ainda castanhas e maçãs. Enquanto decorre a ceia, arde perto dos convivas (aldeia em peso) a chama acolhedora do «canhoto», nome dado ali à tradicional «fogueira dos santos».


O Roubo Ritual

Ainda no dia de Todos os Santos, em certas localidades do Norte, continua a verificar-se o hábito de praticar o «roubo ritual», que consiste em furtar objectos diversos (vasos de flores das janelas, cancelas, carro de lavoura e outros utensílios), que são deixados no meio dos caminhos ou colocados no adro das igrejas. A praxe inclui ainda o roubo de animais, que se levam para longe e se abandonam depois presos a uma árvore.
Estas diversões rituais terão origem nas liberdades licenciosas de natureza mágico-propiciatória praticadas em épocas remotas, cujas reminiscências, à semelhança de muitas outras, perduram ainda hoje um pouco por todo o mundo associadas às festividades cíclicas actuais, religiosas e profanas.



Pão por Deus

Como representantes dos mortos, vamos encontrar no dia dos Fiéis Defuntos e até no dia de Todos os Santos, crianças e pobres que pedem de porta em porta o «pão por Deus», isto é, os manjares cerimoniais que lhes são oferecidos nesta data, afirmando o povo que, «por cada bolo por eles comido, há uma alma que se livra do Purgatório». Crianças e adultos representam, assim, as almas dos mortos que «neste dia erram pelo mundo», simbolizando a oferta do pão por Deus a esmola que se dá por intenção dos defuntos ou uma dádiva feita às próprias almas.
Os grupos de crianças que pedem de porta em porta o «pão por Deus» recebem em troca romãs, nozes, figos, pêros, maçãs, pinhões, rebuçados, bolachas, pequenos pãezinhos e também dinheiro, que guardam destinado aos donativos.

Até há alguns anos atrás, tão enraizada entre nós a oferta do repasto e donativos neste dia em favor dos mortos que, em cumprimento dessa crença, nela tomavam parte como delegados dos defuntos as crianças e os adultos não necessitados, chegando, por intenção das almas a ser enviado, em certas localidades o «pão por Deus» a familiares e amigos.

(…)

Em Lamego chamam aos bolos desta quadra «santoros»  ou «santórios», com forma de pães alongados ostentando nas pontas duas saliências imitando chifres – designados popularmente «cornos» (cuja praxe obrigava a que nessa noite fossem colocados debaixo das almofadas das crianças, com sentido de protecção, ritual ainda hoje mantido, embora sem a adesão de outrora).
Na região da Guarda levam a designação de «santórum» e apresentam um formato oval.
Em Coimbra dão-lhe o nome de «bolinhos bolinhós», tomando em Leiria (mesma região)o nome de «merendeiras», ou «bolos santos».
Em Idanha-a-Nova, os bolinhos tomam o nome de «broinhas dos santos». Na Batalha (Beira Litoral) são uma vez mais os «santoros» ou «santorinhos» [destes comi eu - Rebolaria, Batalha] que as crianças, no dia de Todos os Santos, pedem um pouco por todo o concelho.
Em Óbidos as mulheres fazem as «merendeiras» (pequenos pães de milho com açúcar e erva-doce).

No Alentejo são representados por pequenos pães cozidos especialmente para este dia, conhecido ali por «dia dos bolinhos», continuando a juntar-se à dádiva dos bolos maçãs, pêros, passas de uva, figos secos, nozes, pinhões, amêndoas, castanhas, marmelos e romãs.
No Algarve, os bolos tomam a forma de pequenas broas de farinha de milho, mel, erva-doce e azeite. Em Lagos, os «bolinhos» são achatados, levam farinha, açúcar e erva doce e são cozidos no forno sobre folhas de figueira ou couve.

Em São Miguel (Açores) confeccionam-se nesta quadra as «escaldadas» pequenos pães feitos com farinha de milho, leite e açúcar. 

IN: Soledade Martinho Costa e Jorge Barros (2002), Festas e Tradições Populares: Março e Abril. Lisboa: Círculo de Leitores.

2 de Novembro - Dia de finados - Comemoração de Todos os fiéis defuntos





fotografia de Jorge Barros
A caminho do cemitério, Cós, Alcobaça, 2 de Novembro de 1989