sábado, 29 de dezembro de 2012

Sophia de Mello Breyner Andresen




                  MEDEIA


                         (adaptado de Ovídio)



Três vezes roda, três vezes inunda
Na água da fonte os seus cabelos leves,
Três vezes grita, três vezes se curva
E diz: «Noite fiel aos meus segredos,
Lua e astros que após o dia claro
Iluminais a sombra silenciosa,
Tripla Hecate que sempre me socorres
Guiando atenta o fio dos meus gestos,
Deuses dos bosques, deuses infernais
Que em mim penetre a vossa força, pois
Ajudada por vós posso fazer
Que os rios entre as margens espantadas
Voltem correndo até às suas fontes.
Posso espalhar a calma sobre os mares
Ou enchê-los de espuma e fundas ondas,
Posso chamar a mim os ventos, posso
Largá-los cavalgando nos espaços.
As palavras que digo e cada gesto
Que em redor do seu som no ar disponho
Torcem longínquas árvores e os homens
Despedaçam-se e morrem no seu eco.
Posso encher de tormento os animais,
Fazer que a terra cante, que as montanhas
Tremam e que floresçam os penedos.»


quinta-feira, 27 de dezembro de 2012

"fusinus albacarinoides"




                                                                                                        [para a minina Inês, que faz hoje 1 ano]

a menina do mar








[para a minina Inês, que faz hoje 1 ano]

[um anjo]


Uma criança disse: «Um anjo é uma gaivota.»
«Um anjo é um homem como os outros: o que é, tem asas.»
E outras: «Um anjo é um pássaro cantador.»
«Um anjo é uma andorinha. Tem uma coroa.»
«Um anjo é um homem que tem o sol pendurado atrás da cabeça.»
E uma outra sonhou que tinha engolido o sol.

Herberto Helder, «As Maneiras»/VI (fragmento), Retrato em Movimento, Lisboa, Ulisseia, 1967


[obrigada, Luis Manuel Gaspar]