sexta-feira, 2 de março de 2018
Amália Rodrigues - Vagamundo (1961)
Um dia estava eu num acampamento e levaram-me o Alain Oulman, que tinha feito uma música a pensar em mim, o Vagamundo. Fui ouvir e gostei.
(…)
Para além da música, o Alain, com a sua vasta cultura, fez-me travar conhecimento com grandes poetas. Ele não só fazia as músicas, como ia procurar, aos livros de poesia, letras para as músicas. Dedicou-me um tempo grande. Não me influenciou mas, durante um tempo, andei toda contente com aquela descoberta que ele me trazia. Trabalhámos muito os dois.
(…)
O Alain trouxe um público que não estava comigo (…) Mas o Alain não me veio explicar nada. Eu é que quando não sabia alguma coisa lhe perguntava. (…) A partir deste primeiro disco, o Alain foi sempre muito importante para mim…
(…)
Para além da música, o Alain, com a sua vasta cultura, fez-me travar conhecimento com grandes poetas. Ele não só fazia as músicas, como ia procurar, aos livros de poesia, letras para as músicas. Dedicou-me um tempo grande. Não me influenciou mas, durante um tempo, andei toda contente com aquela descoberta que ele me trazia. Trabalhámos muito os dois.
(…)
O Alain trouxe um público que não estava comigo (…) Mas o Alain não me veio explicar nada. Eu é que quando não sabia alguma coisa lhe perguntava. (…) A partir deste primeiro disco, o Alain foi sempre muito importante para mim…
AMÁLIA RODRIGUES
Amália, uma Biografia por Vítor Pavão dos Santos,
Lisboa, Contexto Editora, p.151
Amália, uma Biografia por Vítor Pavão dos Santos,
Lisboa, Contexto Editora, p.151
Alain Oulman |
quinta-feira, 1 de março de 2018
Arte xávega na Costa da Caparica a Património ImateriaL
LER ARTIGO AQUI
A pesca com a Arte-Xávega na Costa da
Caparica é uma prática de pesca local tradicional, cujos principais
elementos móveis são as embarcações e as redes ou artes. A chata
corresponde a um tipo de embarcação adaptado às condições do mar da
região. As chatas são construídas segundo as indicações do proprietário,
em estaleiros fora do concelho de Almada.
As chatas atualmente utilizadas na pesca com Arte-Xávega na Costa da
Caparica são construídas em madeira ou fibra com medidas aproximadas de
seis metros e vinte de comprimento, dois metros e quarenta de boca e
noventa centímetros de pontal (medidas da Chata S. José com a matricula
TR-151513-L). O fundo da embarcação, sem quilha, é plano para facilitar o
deslizamento na areia (de onde deriva a designação chata) a proa é
larga e elevada, para vencer a rebentação, com painel de popa onde está é
colocado o motor fora de bordo basculante.
A chata divide-se em Proa (onde vão os remadores), Sé do Meio
(compartimento onde se colocam as cordas e a rede) e Popa, onde segue o
arrais, o calador e o camarada que larga o saco.
Na cara do barco em ambos os lados do casco junto à proa, a grande
maioria dos barcos de pesca artesanal da Costa da Caparica tanto os
utilizados da Arte-Xávega como em outras artes de pesca, encontram-se
pintadas imagens de cariz simbólico sendo o olho o mais representativo,
contudo também se encontram outros símbolos tais como estrela,
rosa-dos-ventos, cruz, peixe estilizado, emblema desportivo. Conforme
refere Octávio Lixa Filgueiras estas representações de cariz mágico
religioso estarão associadas à proteção e / ou sacralização do barco
(FILGUEIRAS, 1978). Sendo mais comum a explicação da utilização do
“olho” como proteção contra o “mau-olhado” a dimensão sagrada
encontra-se igualmente patente nos nomes de alguns barcos como S. José,
Deus te Guie ou Há-de ser o que Deus Quiser. Ainda relativamente à
pintura do olho encontram-se várias interpretações junto dos pescadores:
a tradição ou até «para ver o peixe». Destaca-se contudo que entre as
várias representações estilizadas do “olho” pintado na cara do barco uma
das mais características da Costa da Caparica apresenta-se como uma
fusão de olho e peixe que na linha superior apresenta doze pestanas que
segundo alguns pescadores significam os doze apóstolos, alusão que
apresenta um paralelismo acentuado com a imagem votiva existente na
Igreja da Costa da Caparica representando um barco meia-lua tripulado
pelos doze apóstolo.
quinta-feira, 15 de fevereiro de 2018
Joaquim Manuel Magalhães |
In:
Joaquim Manuel Magalhães, «Light at Two Lights», in João Miguel Fernandes Jorge, Jorge Molder, Joaquim Manuel Magalhães,'Uma Exposição', Lisboa, A Regra do Jogo, 1980.
[Retirado Daqui]
Fografias do Boletim Fotográfico
Fotografia de Silva Nogueira Boletim Fotográfico, Janeiro de 1900 |
Fotografia de Augusto Soares Boletim Fotográfico, Outubro e Novembro de 1900 |
Fotografia de F. Viegas Boletim Fotográfico, Setembro de 1900 |
Fotografia de S. Fortes Boletim Fotográfico, Outubro e Novembro de 1900 |
Fotografia de C. Trincão Boletim Fotográfico, Abril de 1900 |
Fotografia do Visconde de Coruche
Boletim Fotográfico, Fevereiro de 1900 |
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Visconde de Coruche
sábado, 3 de fevereiro de 2018
Miguel Martins - Aldeia
Adoro as levadas caudalosas,
serpenteando por entre avencas,
levando consigo pequenos blocos de terra,
ensopando a terra,
matando a sede a raízes
que mais parecem teias de aranha
cujo centro se esconde a vários palmos de distância
ou longilíneas tarântulas
Adoro os Verões iniciáticos,
a aprendizagem de caminhos e trabalhos sob as copas densas,
os banhos na represa por entre libélulas e alfaiates
e o esgar de nojo,
quando, da ponte,
se avista lá ao fundo um gato morto
preso nas silvas das margens de água límpida
Adoro os Invernos laboriosos,
as encostas escorregadias,
a lama nas botas,
a misteriosa caminhada até cada courela,
o gesto medieval que ceifa o talo à couve,
o toucinho na salgadeira
Adoro o regresso do ruído,
a chegada das crianças da cidade,
adoro vê-las subir às amoreiras,
as mãos miúdas confiando em nós de madeira centenária, enquanto os pais me visitam na adega,
cortamos uma broa e abrimos uma garrafa de morangueiro fresco
Adoro as casulas e os paramentos na sacristia
e o pó que os cobre nos meses de ausência do padre
e o branco nu da capela
e a pedra nua de todas as outras casas,
que é da cor das folhas de tabaco secas da plantação que o Eduardo tem ao fundo do povo e esconde dos fiscais
(ele que já viu mais mundo que todos os fiscais da região e trabalhou na PanAm e foi aos Estados Unidos)
Adoro as trutas apanhadas à mão e o viveiro de trutas, nossa única indústria desde que ruiu o moinho de água
e só Deus sabe quanto isso me custou e custa,
saber que não mais sentirei o cheiro do milho acabado de moer
Adoro as idas à mercearia da aldeia vizinha
e a pouquíssima variedade de produtos que aí se encontra,
como se estivéssemos em tempo de guerra
ou o século XX não ousasse começar por aqui
Adoro os fogões a lenha,
as enormes arcas de nogueira,
os colchões de palha de milho
confortavelmente concavados por décadas de hóspedes e a remota possibilidade de serem do tempo
em que João Brandão, “o terror das Beiras”, se acoitou nestas casas
Adoro os audazes mergulhos da ponte metálica coberta de caganitas de cabra
e as cabras
e a mão desusada que as conduz
e que sabe amar quando é chegada a noite
ou quando é chamada a iluminar um recanto de sombra
Adoro as lamparinas e os morcegos que vêm chupar o azeite das torcidas,
o cheiro das queimadas e o cheiro do tojo
acabado de roçar,
e as pequenas manchas roxas
que as amoras esmagadas imprimem no chão
Adoro as ameaças e as benesses do céu
e a certeza de que nelas se escondem todas as respostas da irrevogável vontade de Deus
e adoro como uns são pais dos filhos dos outros
e deixam Deus fora da questão
e não pegam em espingardas
Sim, adoro esta aldeia sem caçadores
em que os pardais só temem os espantalhos
e os gritos que ecoam desde o outro lado das montanhas
Adoro o tio Alfredo, que espantava as almas penadas, batendo com uma corda nas costas,
e o primo Alfredo
que trabalha tanto como quem trabalha mais
e mimetiza o mesmo gesto
para afugentar as dores que isso lhe dá por todo o corpo
Adoro a iniciação sexual dos rapazes,
quase sempre com outros rapazes,
anos antes de terem uma rapariga,
o que só acontece aos doze anos e depois não quer dizer nada,
que é como quem diz, fica vida fora
Adoro o orvalho desenhando folhas de plantas nos vidros das janelas
e janelas nas folhas das plantas
e a nitidez de todos os veios destas
e de todas as veias na pele das mulheres,
que nunca tomaram banhos de sol
e sempre cobrem as cabeças com lenços
ou chapéus de palha
E adoro-vos a vós
que nunca vistes nem vereis a minha aldeia
e acabais de a adoptar pelo útero
serpenteando por entre avencas,
levando consigo pequenos blocos de terra,
ensopando a terra,
matando a sede a raízes
que mais parecem teias de aranha
cujo centro se esconde a vários palmos de distância
ou longilíneas tarântulas
Adoro os Verões iniciáticos,
a aprendizagem de caminhos e trabalhos sob as copas densas,
os banhos na represa por entre libélulas e alfaiates
e o esgar de nojo,
quando, da ponte,
se avista lá ao fundo um gato morto
preso nas silvas das margens de água límpida
Adoro os Invernos laboriosos,
as encostas escorregadias,
a lama nas botas,
a misteriosa caminhada até cada courela,
o gesto medieval que ceifa o talo à couve,
o toucinho na salgadeira
Adoro o regresso do ruído,
a chegada das crianças da cidade,
adoro vê-las subir às amoreiras,
as mãos miúdas confiando em nós de madeira centenária, enquanto os pais me visitam na adega,
cortamos uma broa e abrimos uma garrafa de morangueiro fresco
Adoro as casulas e os paramentos na sacristia
e o pó que os cobre nos meses de ausência do padre
e o branco nu da capela
e a pedra nua de todas as outras casas,
que é da cor das folhas de tabaco secas da plantação que o Eduardo tem ao fundo do povo e esconde dos fiscais
(ele que já viu mais mundo que todos os fiscais da região e trabalhou na PanAm e foi aos Estados Unidos)
Adoro as trutas apanhadas à mão e o viveiro de trutas, nossa única indústria desde que ruiu o moinho de água
e só Deus sabe quanto isso me custou e custa,
saber que não mais sentirei o cheiro do milho acabado de moer
Adoro as idas à mercearia da aldeia vizinha
e a pouquíssima variedade de produtos que aí se encontra,
como se estivéssemos em tempo de guerra
ou o século XX não ousasse começar por aqui
Adoro os fogões a lenha,
as enormes arcas de nogueira,
os colchões de palha de milho
confortavelmente concavados por décadas de hóspedes e a remota possibilidade de serem do tempo
em que João Brandão, “o terror das Beiras”, se acoitou nestas casas
Adoro os audazes mergulhos da ponte metálica coberta de caganitas de cabra
e as cabras
e a mão desusada que as conduz
e que sabe amar quando é chegada a noite
ou quando é chamada a iluminar um recanto de sombra
Adoro as lamparinas e os morcegos que vêm chupar o azeite das torcidas,
o cheiro das queimadas e o cheiro do tojo
acabado de roçar,
e as pequenas manchas roxas
que as amoras esmagadas imprimem no chão
Adoro as ameaças e as benesses do céu
e a certeza de que nelas se escondem todas as respostas da irrevogável vontade de Deus
e adoro como uns são pais dos filhos dos outros
e deixam Deus fora da questão
e não pegam em espingardas
Sim, adoro esta aldeia sem caçadores
em que os pardais só temem os espantalhos
e os gritos que ecoam desde o outro lado das montanhas
Adoro o tio Alfredo, que espantava as almas penadas, batendo com uma corda nas costas,
e o primo Alfredo
que trabalha tanto como quem trabalha mais
e mimetiza o mesmo gesto
para afugentar as dores que isso lhe dá por todo o corpo
Adoro a iniciação sexual dos rapazes,
quase sempre com outros rapazes,
anos antes de terem uma rapariga,
o que só acontece aos doze anos e depois não quer dizer nada,
que é como quem diz, fica vida fora
Adoro o orvalho desenhando folhas de plantas nos vidros das janelas
e janelas nas folhas das plantas
e a nitidez de todos os veios destas
e de todas as veias na pele das mulheres,
que nunca tomaram banhos de sol
e sempre cobrem as cabeças com lenços
ou chapéus de palha
E adoro-vos a vós
que nunca vistes nem vereis a minha aldeia
e acabais de a adoptar pelo útero
(Atol, Clube dos Poetas Vivos, Lisboa, 2002)
Leitura de Raquel Marinho (clicar para ouvir)
segunda-feira, 8 de janeiro de 2018
Chafariz das Moiras (Mouras), Lisboa, Santa Maria Maior
Chafariz das Moiras, Largo do Correio- Mor fotografia de Daniel Soares Ferreira |
Inaugurado em 1816, no vale das Moiras no Lumiar, projecto do arquitecto José
Therésio Michelotti, com água de uma mina ali existente. No entanto, a
mina revelou-se insuficiente para satisfazer a população e a Câmara
Municipal ordenou que se enchesse os depósitos com água proveniente dos Chafarizes da Convalescença e da Cruz do Tabuado. Até 1940 as três bicas do chafariz abasteceram a população (a central recebendo água da mina e as laterais água da distribuição da cidade).
Em meados do século XX procedeu-se a sua demolição, tendo
o seu pano de fachada sido aproveitado e colocado no Largo em frente
ao Palácio do Correio-mor (na rua de São Mamede ) o qual sofreu um
arranjo urbanístico.Informação retirada Daqui
[...]
Ficha descritiva:
Arquitectura infraestrutural, tardo-barroca. Chafariz de espaldar simples composto por paraestática, com pilastras rústicas e toscanas, rematadas em friso e cornija. O espaldar possui apainelado com inscrição e pedra de armas e três bicas circulares, que vertem para tanque contracurvado e galbado, com bordo boleado. Possui réguas metálicas para apoio de vasilhame. Chafariz com a fachada principal reaproveitada de um antigo chafariz do tipo caixa, que se erguia no Lumiar, demolido por questões urbanísticas. Está enquadrado por muro de suporte de terras, formando uma elipse, que cria um amplo largo. De destacar a estrutura do tanque, contracurvado e galbado, o elemento mais elegante e erudito do conjunto.
Informação retirada Daqui Eduardo Portugal, Chafariz das Mouras na Alameda das Linhas de Torres Fotografia do Arquivo Municipal de Lisboa | fotográfico |
O Chafariz das Mouras foi projectado pelo arquitecto José Therésio Michelotti e construído entre 1813-1815. A sua inauguração decorreu no dia 27 de Julho de 1816. Tem a forma de pavilhão de parque. É quadrangular de cobertura tronco-piramidal de arestas curvilíneas, rematada por uma urna. A tabela do frontão desce até envolver a bica central. Tem três bicas. Ostenta o brasão real. Tem uma legenda ao centro dizendo «Utilidade do Público anno de 1815». Este chafariz situava-se na Alameda das Linhas de Torres, mas no século XX, foi demolido e a fachada e a bacia foram transferidos para o Largo do Correio-Mor.
Informação retirada Daqui Eduardo Portugal, Chafariz das Mouras na Alameda das Linhas de Torres Fotografia do Arquivo Municipal de Lisboa | fotográfico |
Chafariz das Mouras na Alameda das Linhas de Torres Fotografai do Arquivo Municipal de Lisboa | fotográfico |
Registo no SIPA - http://www.monumentos.gov.pt/site/APP_PagesUser/SIPA.aspx?id=25673
Mais informação aqui
quarta-feira, 3 de janeiro de 2018
sexta-feira, 20 de outubro de 2017
Francisco Rodrigues Lobo
Águas que, penduradas desta altura,
Caís sobre os penedos descuidadas,
Aonde, em branca escuma levantadas,
Ofendidas mostrais mais fermosura,
Se achais essa dureza tão segura,
Para que porfiais, águas cansadas?
Hei tantos anos já desenganadas,
E esta rocha mais áspera e mais dura.
Voltai atrás por entre os arvoredos,
Aonde caminhais com liberdade
Até chegar ao fim tão desejado.
Mas ai! que são de amor estes segredos.
Que vos não valerá própria vontade
Como a mim não valeu no meu cuidado.
Francisco Rodrigues Lobo, Daqui:
Alberto de Souza, 'Estação Sul e Sueste, Lisboa', 1910 © Museu Nacional De Arte Contemporânea Do Chiado |
Daqui:
Alberto de Sou, [Barcos - Ericeira,1921] |
Daqui:
Luis Manuel Gaspar - Luminária,
[...]
Nada poderá trazer um navio de volta
a este porto prometido às trevas
e ao visco.
No jardim que deixámos para trás
(e lembra hoje uma única teia de tamiça e estopa)
cresceram as luzes da visitação
Não seguimos o rio, não iremos juntos.
Só damos de nós o que jamais
poderão ver
[...]
Luis Manuel Gaspar, Luminária, Alambique, 2015 (2ªedição revista)
.
domingo, 17 de setembro de 2017
sexta-feira, 15 de setembro de 2017
Francisco Rodrigues Lobo
Fermoso rio Lis, que entre arvoredos
Ides detendo as águas vagarosas,
Até que üas sobre outras, de invejosas,
Ficam cobrindo o vão destes penedos;
Verdes lapas, que ao pé de altos rochedos
Sois morada das Ninfas mais fermosas,
Fontes, árvores, ervas, lírios, rosas,
Em quem esconde Amor tantos segredos;
Se vós, livres de humano sentimento,
Em quem não cabe escolha nem vontade,
Também às leis de Amor guardais respeito.
Como se há-de livrar meu pensamento
De render alma, vida e liberdade,
Se conhece a razão de estar sujeito?
Francisco Rodrigues Lobo, Daqui:
quinta-feira, 14 de setembro de 2017
terça-feira, 12 de setembro de 2017
Luis Manuel Gaspar, «O sonho da água dorme no pimenteiro» (Herberto Helder)
n.º 2, tinta-da-china e acrílico sobre papel, 210 x 148 mm, 2017 |
Do: herbário de bolso, de Luis Manuel Gaspar
Sobre a relação dos desenhos com a poesia em Luís Manuel Gaspar, diz-nos Rosa Maria Martelo: «Muitos dos desenhos de Luis Manuel Gaspar subentendem as palavras da poesia. Não apenas porque a surpresa que provocam pode resultar de articulações metafóricas, de um tropo que liga dois reinos para produzir um terceiro, mas também porque, em muitos casos, os desenhos se destinaram a acompanhar poemas, ou partiram de textos; e ainda porque, nas pranchas dedicadas a vários poetas, encontramos as imagens que Luis Manuel Gaspar quis que víssemos nos versos reproduzidos, ou a par deles. É um mundo onde as imagens da poesia e as imagens visuais se interpelam mutuamente. Livremente. Um mundo para ver, ler e imaginar. Fluido, delicado, irónico e inquieto. E cheio de gravidade.»
Daqui:
sábado, 9 de setembro de 2017
Afonso Lopes Vieira - "Photographia Moderna"
Afonso Lopes Vieira, "Sombra na água", Illustração Portugueza, II série, Nº 199, 13 de Dezembro de 1909, pp. 756-760 |
Afonso Lopes Vieira, "Júlia e Zé Maria", Illustração Portugueza, II série, Nº 199, 13 de Dezembro de 1909, pp. 756-760 |
Afonso Lopes Vieira [1910] |
Artigo de 1909: "Photographia Moderna" Aqui e Aqui
sexta-feira, 8 de setembro de 2017
A Donzela Encantada na Ribeira
No final do século dezoito, no lugar de Valverde, vivia um pobre moleiro com a mulher e uma filha ainda moça e muito bonita.
Numa noite de luar, a rapariga desapareceu de casa sem deixar rasto e nunca mais foi vista. Houve quem dissesse que ela se tinha deitado ao mar, mas muita gente acreditava que as bruxas a tinham encantado
O tempo foi passando e a tragédia do desaparecimento da filha do moleiro era contada aos serões a mistura com histórias de almas penadas e feiticeiras.
Num lindo dia de Primavera, passados cerca de cem anos, as lavadeiras foram com a roupa suja para a ribeira, como de costume. Uma delas, mais velha, não teve tempo para lavar tudo, embora tivesse esfregado e espanejado de sol a sol. Continuou o trabalho quando a noite caiu, porque a lua estava clara como se fosse de dia.
Para passar o tempo e disfarçar o medo de estar sozinha, ia cantando. Subitamente o som da sua voz e o ruído dos grilos foram cortados por gritos profundos que apenas duraram um segundo. Quando tudo tinha voltado ao silêncio e a lavadeira ainda estava muda de medo, de novo se ouviram fortes gemidos.
— Santo nome de Deus! Senhora dos Anjos, amparai-me — gaguejou a velha lavadeira e, levantando um pouco a voz, conseguiu dizer a tremer:
— Alma penada ou gente deste mundo que tanto pareceis estar sofrendo, dizei-me onde estais para que vos possa ajudar se isso estiver ao meu alcance.
Ninguém lhe respondeu, mas ela avançou pela margem da ribeira e, quando ainda não tinha dado vinte passos, parou espantada. A ribeira estava linda e pousada sobre ela via se uma rapariga bonita e completamente nua. Parecia envolvida num manto de luz e os cabelos brilhavam como oiro sobre os ombros brancos e macios. A mão esquerda estava fechada, mas na outra tinha um fuso que girava, enrolando um fio de prata. Dos olhos azuis corriam lágrimas.
A lavadeira ficou completamente assombrada e só quando por um ruído leve a visão desapareceu é que a mulher teve coragem de dizer:
— Donzela infeliz, talvez encantada por mau olhado, atende as minhas palavras Se és aquela de quem muitas vezes ouvi falar em pequena, aos meus avós, tudo farei para te ajudar.
A visão apareceu de novo e os lábios vermelhos, mas com um sorriso amargo, disseram meigamente:
— Sou aquela menina infeliz que vossos avós conheceram, mas não posso dizer-vos como foi o meu encantamento. Estou há mais de um século neste martírio, aparecendo de sete em sete anos, neste dia e na hora em que fui encantada, à espera de um rapaz virgem que me possa esconjurar e a quem pertencerei.
Depois de dizer estas palavras, abriu a mão esquerda, mostrou três moedas de oiro e desapareceu.
A lavadeira voltou para casa já tarde da noite, o céu estava coberto de nuvens e no dia seguinte o estranho acontecimento espalhou-se.
Passados sete anos, vários rapazes de Valverde foram-se sentar nas margens da ribeira com a esperança de ver a moça, mas ninguém a viu e sem se saber porquê a donzela lá continua encantada.
Recolhida em Vila do Porto, Ilha de Santa Maria, (Açores) [data dos finais do século XVIII]
Daqui
Luiz Osmundo Toulson - A Lavadeira de Vizela
Portimão - Desembarque do peixe
Artur Pastor, Desembarque do peixe, Portimão, anos 60 fotografia do Arquivo Municipal de Lisboa | fotográfico |
Artur Pastor, Desembarque do peixe, Portimão, anos 60 fotografia do Arquivo Municipal de Lisboa | fotográfico |
Artur Pastor, Desembarque do peixe, Portimão, anos 60 fotografia do Arquivo Municipal de Lisboa | fotográfico |
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