quarta-feira, 3 de junho de 2020

[Fonte da Horta Navia, junto da Ponte de Alcântara]



Jorge Veiga Testos, Anotações de diplomática judicial portuguesa: 
os tribunais superiores na Lisboa quinhentista

RESUMO 

Tendo por base a análise de um conjunto de cartas de sentença dos tribunais superiores portugueses – Casa do Cível e Casa da Suplicação – datadas da primeira metade do século XVI, o artigo procura reconstituir os respetivos mecanismos de produção escrita. A análise do seu discurso diplomático permite evidenciar as particularidades desta tipologia documental. 

Documento Judicial:



A: Autor;  
R: Réu;  O: Objecto de contenda;  J: Julgador;   E: Escrivão

Fonte da Horta Navia







- 13.02.1575

[D. Sebastião desembarga um conjunto de questões relativas a Lisboa]

[Sobre a nomeação de D. Miguel de Cabedo para vereador; sobre os padrões de medida; sobre as obras da Fonte da Horta Navia [orta nabia/ortanabia]; sobre a ampliação do chafariz d' el rei; sobre as cautelas a ter devido aos casos de peste verificados na Holanda; e sobre as obras na nova igreja de S. Sebastião.]


Arquivo Municipal de Lisboa | Núcleo Histórico


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Rodrigo Banha da Silva - O sítio do Cemitério dos Prazeres (Lisboa): um assentamento romano no espaço rural de Olisipo



RESUMO 

No sítio do actual Cemitério dos Prazeres, em Lisboa, se descobriu em 1996, e de maneira fortuita, a pré-existência no local de um sítio romano. Apresentam-se agora os escassos dados inéditos relativos ao arqueossítio com o CNS 37436. Relaciona-se, no texto, o sítio de Prazeres com as restantes ocupações do baixo vale da Ribeira da Alcântara, que incluem um eixo viário regional romano importante e a possível existência de um locus sagrado conectado com a deusa Nabia. A panóplia de materiais inclui elementos que cobrem um espectro cronológico entre o séc. II a.C., pelo mais, e o séc. IV-V d.C., pelo menos, e incluem materiais de construção (olaria de construção e mosaico) que atestam a capacidade aquisitiva da comunidade. O local levanta problemáticas pertinentes acerca da antiguidade relativa dos assentamentos rurais dos agri olisiponenses e da forma como esta assume expressão material arqueológica, aspectos essenciais para a construção de uma leitura da dinâmica de ocupação do espaço rural nas etapas iniciais da Época Romana que está, todavia, longe de suficientemente esclarecida


Detalhe da panorâmica de Lisboa de Grabriel Del Barco, c. 1700, com indicação dos sítios romanos conhecidos
 e da ponte Alcântara (Museu Nacional do Azulejo e Cerâmica) 


[...]
... o espaço do Vale de Alcântara era atravessado pela principal via terrestre que comunicava com os espaços ocidentais da Península de Lisboa das áreas de Oeiras, Cascais e sul da Serra de Sintra, densamente povoados ao longo da Época Romana(CARDOSO, 2002). Um dos principais elementos deste itinerário terrestre era, justamente, a ponte de Alcântara, cuja remota origem romana é altamente provável, considerando o próprio topónimo que remete para a sua existência já no período medieval muçulmano. Construída em alvenaria, possuía ainda em 1582, aquando da batalha de Alcântara, 6 arcos, como surge representada em 1662, e os registos de 1727 apontam-lhe 90 metros de comprimento e uma largura de 6,20 metros (SILVA, 1942). Seria depois desmantelada em 1887.

Remontando ao século XIV, a Porta de Santa Catarina da muralha fernandina de Lisboa, genericamente localizável na zona do Chiado lisboeta (Largo das Duas Igrejas), dava acesso ao trajecto desta estrada, então nomeada «caminho da Horta Navia». Este topónimo aparece em documentação manuscrita medieval já desde o séc. XIII (reinados de Afonso II ou III), sob a forma latina «Hortus Navia» (SILVA, 1942: pág. 75), aspecto que já havia chamado a atenção de Leite de Vasconcelos, que supôs a existência na zona da antiga foz da Ribeira de Alcântara de um santuário de origem pré-romana dedicado a Nabia, divindade aquática de cariz profilático (REIS 2017: pág. 256; VASCONCELOS 1988 [1905]: pp. 278-279). 

Na esteira daquele erudito português, Vieira da Silva (SILVA, 1942) e, mais tarde, José d´Encarnação (ENCARNAÇÃO, 1975) e José Cardim Ribeiro (RIBEIRO, 1982-83: pp. 6-8), iriam defender a probabilidade da existência de um espaço sagrado devotado à Deusa Nabia/ Navia nas imediações, possivelmente associado à ocorrência de águas na encosta meridional e ocidental dos Prazeres: ali se encontra ainda hoje o remanescente da «Fonte Santa», local alvo de especial devoção popular documentada desde o séc. XVII, depois transformado num chafariz na centúria de oitocentos. A estrutura hidráulica ainda hoje subsiste, discreta e com lastimável enquadramento, na actual Rua de Possidónio da Silva, artéria degradada que leva o nome de um dos principais arqueólogos portugueses do séc. XIX. 

O sugestivo topónimo de Horta Navia era aplicado a uma vasta parcela de terreno no sopé do pequeno vale encaixado entre a vertente norte das Necessidades e a encosta sul do morro dos Prazeres (este, onde se detectou a ocupação romana), em local hoje sobreposto pelas instalações ferroviárias da gare de Alcântara-Terra.

[...]


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Cira Arqueologia, n.º 6, Novembro, 2018

segunda-feira, 1 de junho de 2020

SEBASTIÃO DA GAMA - AS FONTES




Havia fontes na montanha.
Mas estavam fechadas.
Ignoradas,
beijavam só as veias da montanha.

Ora um dia
não sei que vento passou
que me ensinou
aquelas fontes que havia.

Eu tinha mãos e mocidade ;
só não sabia p'ra quê.
Fez-se nesse momento claridade.

Rasguei o ventre dos montes
e fiz correr as fontes
à vontade.

Então
veio quem tinha sede e quem não tinha.
De todas as aldeias
vieram, cantando as moças
encher as bilhas.
E eu fui também cantando ao som das águas ...

Cantavam as minhas mãos, cantavam as fontes.
Era um canto jucundo,
cheio de Sol.
Mas a meio da nota mais alegre
muita vez uma lágrima nascia.

( Ai quantos, quantos,
minha canção tornava mais conscientes
da sua melancolia
sem remédio !
Ai os que já perderam a coragem
de reclamar a sua conta de água !
Ai a mágoa
que lhes era meu hino !
Ai o insulto desumano
à sua melancolia !)

Era a meio do canto que surgia
seu travo amargo ...

Mas a meu lado, as águas
iam matando a sede de quem vinha ....
19 e 20.10.1946
Sebastião da Gama, Cabo da Boa Esperança, (1947)

terça-feira, 26 de maio de 2020

Fernando Pessoa - A água da chuva desce a ladeira.


A água da chuva desce a ladeira.
        É uma água ansiosa.
Faz lagos e rios pequenos, e cheira
        A terra a ditosa.
Há muito que contar a dor e o pranto
        De o amor os não querer...
Mas eu, que também o não tenho, o que canto
        É uma coisa qualquer.

Bernardo Soares - ...e as algas como molhados cabelos empastando o rosto...



...e as algas como molhados cabelos empastando o rosto morto das águas.
Um som suave de rio largo, uma indecisa frescura aquática, uma saudade audível, oculta, um amarelo morto de movimento.
Leves, leves as sombras calmas.
A noite era cheia daquelas pequenas nuvens muito brancas, que se destacam umas das outras. Vista através de uma ou outra delas, a Lua tinha em seu torno um halo azul, castanho e amarelo, com uns tons supostos de verde-vivo. Entre as árvores o céu era dum azul-negro profundíssimo, longínquo, irrevogável. As estrelas viam-se ora através das nuvens, ora, muito longe, mas entre elas. Uma saudade de coisas idas, de grandes passados da alma, talvez porque em reencarnações antigas, olhos nossos, no corpo físico, houvesse visto, este luar sobre florestas longínquas, quando selvática ainda, a alma infanta talvez pressentia, por uma memória em Deus ao contrário, no futuro das suas reencarnações, esta lua retrospectiva. E assim essas duas luas davam mãos de sombra por sobre a minha cabeça abatida.

domingo, 29 de março de 2020

Senhora da Rocha, de Sophia de Mello Breyner Andresen



Isto já se vai tornando um hábito para mal de todos, especialmente de vocês. Mas este foi a pedido, o que me deixa muito feliz. Cá está ele com muito carinho, Helena Nilo[Daniel Soares Ferreira - Aqui ]





SENHORA DA ROCHA

Tu não estás como Vitória à proa
Nem abres no extremo do promontório as tuas asas
Nem caminhas descalça nos teus pátios quadrados e caiados
Nem desdobras o teu manto na escultura do vento
Nem ofereces o teu ombro à seta da luz pura

Mas no extremo do promontório
Em tua pequena capela rouca de silêncio
Imóvel, muda inclinas sobre a prece
O teu rosto feito de madeira e pintado como um barco

O reino dos antigos deuses não resgatou a morte
E buscamos um deus que vença connosco a nossa morte
É por isso que tu estás em prece até ao fim do mundo
Pois sabes que nós caminhamos nos cadafalsos do tempo

Tu sabes que para nós existe sempre
O instante em que se quebra a aliança do homem com as coisas
Os deuses de mármore afundam-se no mar
Homens e barcos pressentem o naufrágio

E por isso não caminhas cá fora com o vento
No grande espaço liso da luz branca
Nem habitas no centro da exaltação marinha
O antigo círculo dos deuses deslumbrados

Mas rodeada pela cal dos pátios e dos muros
Assaltada pelo clamor do mar e a veemência do vento
Inclinas o teu rosto

Imóvel muda atenta como antena.



Sophia de Mello Breyner Andresen , Geografia, 1962



domingo, 5 de janeiro de 2020

Viveiro de Trutas de Aguincho




Helena Nilo, Viveiro de trutas de Aguincho, Dezembro de 2019


Helena Nilo, Viveiro de trutas de Aguincho, Dezembro de 2019


Helena Nilo, Viveiro de trutas de Aguincho, Dezembro de 2019



Helena Nilo, Viveiro de trutas de Aguincho, Dezembro de 2019


Helena Nilo, Viveiro de trutas de Aguincho, Dezembro de 2019


Helena Nilo, Viveiro de trutas de Aguincho, Dezembro de 2019


Helena Nilo, Viveiro de trutas de Aguincho, Dezembro de 2019
(companheiro de almoçarada, já de barrinha cheia... fomos-lhe oferecendo algumas cabeças, não todas, pois nesta trutas fritas, tão crocantes, marcha tudo menos a espinha)


Helena Nilo, Viveiro de trutas de Aguincho, Dezembro de 2019