terça-feira, 5 de fevereiro de 2013



A Fevereiro e ao rapaz perdoa tudo quanto faz,  
se Fevereiro não for secalhão e o rapaz não for ladrão

segunda-feira, 4 de fevereiro de 2013






"Para acompanhar as tuas mãos, vi este poema da Adília..."

"Eu quero
um par de luvas
de que cor não sei
para desvestir as mãos
não pense que é para esconder as mãos
não quero desvestir as mãos
não tenho medo das impressões digitais
é para desvestir as mãos
é isso mesmo só isso
não vale a pena abrir os dedos das luvas
dedo a dedo
com a espátula de madeira
não vale a pena deitar pó
de talco dentro dos dedos
essas luvas servem
para desvestir as mãos?
deixe-me ver a sua mão
I
como tem a mão
como é que fez isso?
podia responder-lhe assim
Me gusta ver la sangre!"

in O Decote da Dama de Espadas, Imprensa Nacional-Casa da Moeda, 1988.



obrigada Daniel  

sábado, 29 de dezembro de 2012

Sophia de Mello Breyner Andresen




                  MEDEIA


                         (adaptado de Ovídio)



Três vezes roda, três vezes inunda
Na água da fonte os seus cabelos leves,
Três vezes grita, três vezes se curva
E diz: «Noite fiel aos meus segredos,
Lua e astros que após o dia claro
Iluminais a sombra silenciosa,
Tripla Hecate que sempre me socorres
Guiando atenta o fio dos meus gestos,
Deuses dos bosques, deuses infernais
Que em mim penetre a vossa força, pois
Ajudada por vós posso fazer
Que os rios entre as margens espantadas
Voltem correndo até às suas fontes.
Posso espalhar a calma sobre os mares
Ou enchê-los de espuma e fundas ondas,
Posso chamar a mim os ventos, posso
Largá-los cavalgando nos espaços.
As palavras que digo e cada gesto
Que em redor do seu som no ar disponho
Torcem longínquas árvores e os homens
Despedaçam-se e morrem no seu eco.
Posso encher de tormento os animais,
Fazer que a terra cante, que as montanhas
Tremam e que floresçam os penedos.»


quinta-feira, 27 de dezembro de 2012

"fusinus albacarinoides"




                                                                                                        [para a minina Inês, que faz hoje 1 ano]

a menina do mar








[para a minina Inês, que faz hoje 1 ano]

[um anjo]


Uma criança disse: «Um anjo é uma gaivota.»
«Um anjo é um homem como os outros: o que é, tem asas.»
E outras: «Um anjo é um pássaro cantador.»
«Um anjo é uma andorinha. Tem uma coroa.»
«Um anjo é um homem que tem o sol pendurado atrás da cabeça.»
E uma outra sonhou que tinha engolido o sol.

Herberto Helder, «As Maneiras»/VI (fragmento), Retrato em Movimento, Lisboa, Ulisseia, 1967


[obrigada, Luis Manuel Gaspar]

sábado, 2 de junho de 2012

A Fonte da Moura de S. Julião

    Na aldeia de S. Julião, concelho de Bragança, havia uma fonte conhecida como a “Fonte da Moura” e também lhe chamavam “Fonte de Cima da Trembla”, pois situava-se no cimo de uma lameira com esse nome.
    Dizem as pessoas de idade que à meia-noite era costume ouvir-se ali tecer um tear. E que numa madrugada de S. João, uma mulher foi à fonte e entrou-lhe a ponta de um cordão para o cântaro. Ela pegou nele e começou a dobar até fazer um novelo grande, tão grande que já não lhe cabia nas mãos. E como só com muita dificuldade conseguia dobar mais, resolveu partir o cordão.
    Nesse mesmo instante o novelo desapareceu-lhe das mãos, e ouviu uma voz que disse:
    — Marota, que me encantaste para toda a minha vida!
    E o tear então nunca mais se ouviu. Dizem que a voz era de uma moura encantada. Se a mulher não tem partido o cordão, a moura teria aparecido na figura de serpente e não fazia mal a ninguém. Bastaria que a mulher lhe tivesse deitado um pouco de saliva na cabeça para ela ficar desencantada e em figura de uma jovem muito bonita.
    E traria com ela toda a sua riqueza.


Fonte: PARAFITA, Alexandre A Mitologia dos Mouros: Lendas, Mitos, Serpentes, Tesouros Vila Nova de Gaia, Gailivro, 2006 , p.217-218

AQUI

"onde há redes há rendas" II

A renda de bilros é uma indústria da beira-mar, destas mulheres loiras, de olhos azuis e rosto comprido – as da Foz, as de Leça e as de Vila do Conde – que passavam a vida à espera dos homens, enquanto as mãos ágeis iam tecendo ternura e espuma do mar...

Raul Brandão, Os Pescadores








 [fotografias retiradas da Internet; autor desconhecido]



quinta-feira, 31 de maio de 2012

diabruras, santidades e prophecias...




"As fadas são encantos, de corpo gentil, rosto formoso, olhar meigo e cabellos côr de oiro. Representam o génio do bem.

No mesmo caso poderemos considerar as moiras encantadas, que pertencem á mythologia peninsular. São também lindezas, que aparecem geralmente nas fontes, e com a sua formosura seduzem os mortaes.

As feiticeiras, de extrama belleza mas com mau instincto, teem olhar vertiginoso, modos frios e retrahidos. Associadas com espiritos infernaes, usam de muitas artimanhas para illudirem as pessoas ignorantes e fracas, incutindo-lhes pensamentos satanicos.
As bruxas e mulheres de virtude são quasi sempre velhas immundas, de aspecto repelente. Resmungam em rouquenho orações cabalisticas estropiando algum latinorio; mas para fazerem sortilegios teem de pedir a intervenção do diabo."

‎"A razão de ser o burro no nosso paiz o escolhido para estas transformações infernaes, não se acha demonstrada philosophicamente. Dizem que o pobre animal em pequeno enganara o diabo; mostrando uma agilidade e esperteza que mais tarde perdeu; e que, talvez, d'ahi proviesse a sua condemnação ao despreso.
O burro é quadrupede ignorante mas tão paciente, que só tem um rival - o camello, com inquestionaveis direitos á estima e consideração dos homens, das mulheres e das creanças que lhe são affeiçoadas: basta contar os relevantes serviços que presta e tem prestado. O ditado popular considera-o garantia para maus cavalleiros, dizendo: antes burro que me leve que cavallo que me derrube."


‎"Os lobishomens e asininohomens são inoffensivos; andam apenas comprindo a triste sina, procurando sempre os sitios ermos e pouco alumiados. Quando andam fóra do encanto, distinguem-se dos outros homens em terem as orelhas mais cumpridas, as ventas arrebitadas e escuras, o olhar de soslaio e o halito ferido. São muito desconfiados, tem a voz debil, difficil e guttural, as phalanges dos dedos das mãos, na face dorsal, callejadas, cabellos vastos e emaranhados, de côr ruiva com laivos escuros, que muitos confundem com os restos da agua circassiana, e da cova do ladrão cahe uma pequena guedelha em caracol.
Lobishomem, esta etymologia só é bem cabida quando o homem se transforma em lobo, o que tem sido pouco vulgar no nosso paiz, que, talvez, por ser quente, o homem se metamorphoseia as mais das vezes em burro, e n'este caso deve dizer-se asininohomem."


[ obrigada, Daniel  :) ]

mãos que trabalham...



[ jimmy ]

quarta-feira, 2 de maio de 2012

que as mãos puxam...






Maias e Maios -1 de Maio


fotografia de Jorge Barros

 

As Maias

Todos os anos, de 30 de Abril para 1 de Maio é tradição no Minho, Douro e Beira Alta, que se coloquem à porta ou janelas de casa ramalhetes de giestas amarelas, também conhecidas por maias por florirem em Maio. Todavia, noutras regiões de Portugal é também celebrado, embora de forma algo diferente [1].

Leite de Vasconcelos [3]  refere que a mais “antiga menção desta festa popular, festa evidentemente naturalística, posto mais ou menos desviada da sua significação primitiva, já pelo próprio Paganismo, já pelo Cristianismo, creio que se acha nestas linhas da Postura da câmara de Lisboa de 1385: «Outro sim estabelecemos que daqui em diante em esta Cidade e em seu termo não se cantem as Janeiras nem Maias, nem outro nenhum mês do ano.»

É referido também que as origens desta tradição, de reminiscências pagãs, encontra-se ligada a ritos de fertilidade, do início da Primavera e do novo ano agrícola, tal como se afirme que afasta o mau-olhado e as bruxas de casa [1] [2].

As Maias propriamente ditas constam de duas partes: o enramalhamento das portas, e o “Maio-moço”. A primeira é celebrada no 1º de Maio no Minho, Douro, Beira Alta, entre outros, onde se enfeitam “as portas das casas com ramos de giestas, chamadas Maias (…). O povo dá destes costumes duas explicações (…):
  1. Quando a Virgem foi para o Egipto, deixou pelo caminho muitos ramos de giesta para não se enganar na volta;
  2. Quando Jesus Cristo nasceu, os Judeus procuraram-no para o matarem, e, como soubessem que ele estava em certa casa, colocaram-lhe à porta um ramo de giesta, a fim de no dia seguinte o prenderem. Nesse dia porém, todas as casas da povoação apareceram marcadas, e os Judeus não puderam dar com ele [3].

Com o advento do Cristianismo atribuiu-se a este velho ritual pagão um carácter religioso ligado à Festa da Santa Cruz e, mesmo, ao Corpo de Deus. A lenda, alusiva a esta tradição, que com mais frequência se ouve no Alto Minho, reza assim: Herodes soube que a Sagrada Família, na sua fuga para o Egipto, pernoitaria numa certa aldeia. Para garantir que conseguiria eliminar o Menino, Herodes dispunha-se a mandar matar todas as crianças. Perante a possibilidade de um tão significativo morticínio, foi informado, por um outro "Judas", que tal poderia ser evitado, bastando para isso, que ele próprio colocasse um ramo de giesta florida na casa onde se encontrava a Sagrada Família, constituindo um sinal para que os soldados a procurassem e consumassem o crime... A proposta do "Judas" foi aceite e Herodes tratou de mandar os seus soldados à procura da tal casa. Qual não foi o espanto dos soldados quando, na manhã seguinte, encontraram todas as casas da aldeia com ramos de giesta florida à porta, gorando-se, assim, a possibilidade do Menino Jesus, ser morto [2].

Daí terá vindo essa tradição de colocar ramos e giestas (ou conjuntamente com outras flores, coroas), nas portas e janelas das casas, na véspera do 1º de Maio. De registar, ainda, que no Alto Minho este costume se estende aos carros de bois, aos automóveis, aos tractores, etc. Em certas localidades, coloca-se o raminho de giesta porque... o Maio é tolo! Noutras, os rapazes que estão para casar, metem por baixo das portas das casas das moças "de bom comportamento" (sem disso elas se aperceberem) uma "maia de rosas" [2].


Bibliografia:
[1] Falcão do Minho, 2006. Tradição das Maias. Site disponível: Jornal Falcão do Minho; URL: http://www.falcaodominho.pt/jornal/fm_news.php?nid=38.
[2] RTAM, 2004. Os Maios… As Maias. Site Disponível: RTAM – Região de Turismo do Alto Minho; URL: http://www.rtam.pt/index.php?id_categoria=3&id_item=410
[3] Vasconcelos, José Leite de, 1938. OPÚSCULOS Volume V – Etnologia (Parte I). Imprensa Nacional, Lisboa.

DAQUI

outras fotografias aqui: maias e maios ... 1 de Maio