segunda-feira, 14 de outubro de 2013
Bernardo Soares - ...e as algas como molhados cabelos empastando o rosto...
...e as algas como molhados cabelos empastando o rosto morto das águas.
Um som suave de rio largo, uma indecisa frescura aquática, uma saudade audível, oculta, um amarelo morto de movimento.
Leves, leves as sombras calmas.
A noite era cheia daquelas pequenas nuvens muito brancas, que se destacam umas das outras. Vista através de uma ou outra delas, a Lua tinha em seu torno um halo azul, castanho e amarelo, com uns tons supostos de verde-vivo. Entre as árvores o céu era dum azul-negro profundíssimo, longínquo, irrevogável. As estrelas viam-se ora através das nuvens, ora, muito longe, mas entre elas. Uma saudade de coisas idas, de grandes passados da alma, talvez porque em reencarnações antigas, olhos nossos, no corpo físico, houvesse visto, este luar sobre florestas longínquas, quando selvática ainda, a alma infanta talvez pressentia, por uma memória em Deus ao contrário, no futuro das suas reencarnações, esta lua retrospectiva. E assim essas duas luas davam mãos de sombra por sobre a minha cabeça abatida.
Um som suave de rio largo, uma indecisa frescura aquática, uma saudade audível, oculta, um amarelo morto de movimento.
Leves, leves as sombras calmas.
A noite era cheia daquelas pequenas nuvens muito brancas, que se destacam umas das outras. Vista através de uma ou outra delas, a Lua tinha em seu torno um halo azul, castanho e amarelo, com uns tons supostos de verde-vivo. Entre as árvores o céu era dum azul-negro profundíssimo, longínquo, irrevogável. As estrelas viam-se ora através das nuvens, ora, muito longe, mas entre elas. Uma saudade de coisas idas, de grandes passados da alma, talvez porque em reencarnações antigas, olhos nossos, no corpo físico, houvesse visto, este luar sobre florestas longínquas, quando selvática ainda, a alma infanta talvez pressentia, por uma memória em Deus ao contrário, no futuro das suas reencarnações, esta lua retrospectiva. E assim essas duas luas davam mãos de sombra por sobre a minha cabeça abatida.
s.d.
Livro do Desassossego. Vol.I. Fernando Pessoa. (Organização e fixação de inéditos de Teresa Sobral Cunha.) Coimbra: Presença, 1990. - 82.
"Fase decadentista", segundo António Quadros (org.) in Livro do Desassossego, por Bernardo Soares, Vol I. Fernando Pessoa. Mem Martins: Europa-América, 1986.
daqui: http://arquivopessoa.net/textos/2117
daqui: http://arquivopessoa.net/textos/2117
Bernardo Soares - Os teus colares de pérolas fingidas amaram comigo...
Os teus colares de pérolas fingidas amaram comigo as minhas horas
melhores. Eram cravos as flores preferidas, talvez porque não
significavam requintes. Os teus lábios festejavam sobriamente a ironia
do seu próprio sorriso. Compreendias bem o teu destino? Era por o
conheceres sem que o compreendesses que o mistério escrito na tristeza
dos teus olhos sombreara tanto os teus lábios desistidos. A nossa Pátria
estava demasiado longe para rosas. Nas cascatas dos nossos jardins a
água era pelúcida de silêncios. Nas pequenas cavidades rugosas das
pedras, por onde a água escolhia, havia segredos que tivéramos quando
crianças, sonhos do tamanho parado dos nossos soldados de chumbo, que
podiam ser postos nas pedras da cascata, na execução estática duma
grande acção militar, sem que faltasse nada aos nossos sonhos, nem nada
tardasse às nossas suposições.
s.d.
Livro do Desassossego por Bernardo Soares. Vol.I.
Fernando Pessoa. (Recolha e transcrição dos textos de Maria Aliete
Galhoz e Teresa Sobral Cunha. Prefácio e Organização de Jacinto do Prado
Coelho.) Lisboa: Ática, 1982. - 266.
"Fase decadentista", segundo António Quadros (org.) in Livro do Desassossego, por Bernardo Soares, Vol I. Fernando Pessoa. Mem Martins: Europa-América, 1986.
daqui: http://arquivopessoa.net/textos/140
daqui: http://arquivopessoa.net/textos/140
sexta-feira, 11 de outubro de 2013
Luiza Neto Jorge - ANOS QUARENTA, OS MEUS
![]() |
fotografia de Artur Pastor |
ANOS QUARENTA, OS MEUS
De eléctrico andava a correr meio mundo
subia a colina ao castelo-fantasma
onde um pavão alto me aflorava muito
em sonhos, à noite. E sofria de asma
alma e ar reféns dentro do pulmão
(como o chimpanzé que à boca da jaula
respirava ainda pela estendida mão).
Salazar, três vezes, no eco da aula.
As verdiças tranças prontas a espigar
escondiam na auréola os mais duros ganchos.
E o meu coito quando jogava a apanhar
era nesse tronco do jardim dos anjos
que hoje inda esbraceja, numa árvore passiva.
Níqueis e organdis, espelhos e torpedos
acabou a guerra meu pai grita «Viva».
Deflagram no rio golfinhos brinquedos.
Já bate no cais das colunas uma
onda ultramarina onde singra um barco
pra Cacilhas e, no céu que ressuma
névoas, águas mil, um fictício arco-
-íris como que é, no seu cor-a-cor,
uma dor que ao pé doutra se indefine.
No cinema lis luz o projector
e o FIM através do tempo retine.
Luiza Neto Jorge
obrigada, Daniel
ALDEIAS SONORAS
“Aldeias Sonoras” é um projecto educativo da Binaural/Nodar
de mapeamento sonoro de zonas rurais portuguesas, em paralelo com o seu
levantamento geográfico, histórico e sócio-cultural. O projecto envolve
escolas básicas e secundárias de zonas rurais de diversas regiões de
Portugal, tendo ocorrido um primeiro módulo no ano lectivo 2008/2009 em
parceria com a Escola Secundária de São Pedro do Sul e um segundo módulo
no ano de 2010 em parceria com diversas escolas de zonas por onde passa
o rio Paiva, integrado no projecto “Paivascapes #1“
O projecto pretende evidenciar a riqueza sonora do mundo rural português e a necessidade de o registar, envolvendo crianças e jovens nessa descoberta, promovendo em paralelo o sentido de identidade, de diversidade e de orgulho em viver no campo.
“Aldeias Sonoras” envolve uma série de
módulos de aprendizagem teórico-prática, com o objectivo de dotar os
alunos de conhecimentos de tecnologias de registo e edição de sons,
utilização de blogs para a organização e distribuição de informação,
associando cada etapa do projecto a diversas disciplinas curriculares
(nas áreas da arte, história, cidadania, geografia, tecnologias de
informação, etc.).
obrigada, Daniel
Etiquetas:
água,
bica,
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rio,
sonoplastia
quinta-feira, 10 de outubro de 2013
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