sábado, 24 de abril de 2010

Lenda do rio Arade

 
Rio Arade, rio Arade,
Diz a voz da tradição
Que uma moira aqui chorou,
Trazida por Rei Cristão...

Foi em tempos tão remotos,
Em tempos que já lá vão,
Que a luta era mais acesa
Entre a Cruz e o Alcorão...

Era tudo fogo e ferro,
Em chamas ardia o chão,
E, a blasfêmia proclamada,
Carecia de perdão...

E se Cristo alçava a cruz
Aos valentes portugueses,
Allah, de longe, incitava
Os moiros, algumas vezes...

Os dias assim passavam,
Tão negros, sem exagero,
Que nada ali mais se ouvia
Que as vozes do desespero...

Quebravam-se alfanjes moiros,
Duras lanças portuguesas,
Nesses combates hostis,
Pelos montes, por devesas...

E diz a lenda, ela sempre,
Que o sangue que o chão bebia
Numa fonte mais à frente,
Muitas vezes, apar’cia...

É por isso que ainda hoje,
Até por gosto bizarro,
Se apanho terra de Silves,
É vermelha, cor de barro...

Vamos ao que mais importa
Nesta longa narração:
Saber o que aconteceu
À moita e ao rei cristão...

Era um dia, ao sol poente
Brilhavam núvens nos céus,
E El-Rei das hostes cristãs
Rezava, sózinho, a Deus.

Senão quando, senão quando
Junto de si apar’ceu
Uma visão, a mais linda,
Vinda lá dum outro céu.

Pronto El-Rei ali quedou
A fervorosa oração;
Logo, também, inquiriu:
— “Quem és tu, aparição?...

— “Eu sou Fhatma, a engeitada;
“Não tenho pai, nem irmãos,
“E assim me dou, pura e virgem,
“Ao forte Rei dos cristãos...

Levou-a El-Rei consigo,
Na garupa do cavalo;
Prestes, dela se tomou,
Não seu Rei, mas seu Vassalo...

E, numa curva do rio,
Num lugar que é Encherim,
Entre flores de laranjeira,
El-Rei lhe falou assim:

— “Tu és flor ou és mulher?...
 “És verdade ou tentação?...
 “Tu, que és moira, quer’s ficar
“Aqui no meu coração?.,,

Era a moira só ternura,
E sorria como ainda
O guerreiro outra não vira
Sorrir, morena e tão linda...

Mas Fhatma ali respondeu:
— Sou mulher, mas, se me queres,
Sou só tua, apenas tua;
‘Faz de mim quanto quiseres!...

Abraços assim e beijos
Não foram jamais trocados,
Nos tempos vindos depois,
Nem nos tempos já passados...

Porque o amor não era amor,
Era coisa tão sem nome,
Como a água que mata a sede
Ou o pão que mata a fome.

Foi-se El-Rei de novo à guerra
E a princesa, porque o era,
Ficou-se, naquele vale,
Sempre à espera, sempre à espera...

Passaram tempos vindouros,
Longa noite, longo dia,
Mas EI-Rei não mais voltou
Para ver quem não o via...

E a moira que filha fora
Do príncipe Ben Ahr-ade,
Foi-se, a pouco, ali finando,
Só chorando de saudade...

Lágrimas do céu bebia,
Nas longas noites chuvosas,
Para as transformar, depois,
Noutras bem mais copiosas...

Eis, assim, foi engrossando
Aquela magra ribeira,
Onde a moira se quedara,
Mais chorosa, à sua beira...

Os tempos foram passando,
Mas a ribeira era agora
Um rio que ia morrer
Noutras águas, mar em fora...

Logo o vulgo, sempre o vulgo,
Depois, para a eternidade,
Ali mesmo baptizou
O rio, de Rio Arade...

Por isso, nos meus ouvidos,
Em longas noites de v’rão,
Ainda ouço alguém cantar
Aquela estranha canção:

— “Rio Arade, Rio Arade,
“Diz a voz da tradição
“Que uma moira aqui chorou,
“Trazida por Rei Cristão...

LOPES, Morais Algarve: as Moiras Encantadas s/l, Edição do Autor, 1995 , p.63-67


Fonte

segunda-feira, 5 de abril de 2010

Prendas de Páscoa









Para presentear afilhados, familiares, amigos e namorados

Festa de Aleluia









Celebração antiga e singular da quadra da Páscoa  ao que parece, única no País -, poderá dizer-se que tem início na Quinta-Feira Santa quando grupos de crianças começam a recolher flores destinadas aos «ramos» (se forem meninas) e às «cruzes» (se forem rapazes). A predominância das flores recai na «aleluia» (chamadas, noutras regiões, «giesta», ou «páscoa»).
O Desfile sai da Capela de São Sebastião [Tomar] às nove horas da manhã de domingo de Páscoa. A idade dos componentes do cortejo, que chega a comportar centenas de crianças, não pode exceder os doze anos.

Barro, Jorge e Soledade Martinho Costa (2002), Festas e Tradições Populares: Março e Abril. Lisboa: Círculo de Leitores. 

domingo, 4 de abril de 2010

queima do Judas

(fotografia de Jorge Barros)

Benção do Lume Novo e da Água


A benção do lume novo, praxe religiosa, 
praticada no início da Vigília Pascal, onde
é solenemente aceso o círio pascal - fonte
de chama para as velas dos fiéis.


A bênção da água - cerimónia idêntica à da
bênção do lume novo e realizada imediatamente
a seguir - consiste na simbologia da purificação
da água que será colocada nas pias baptismais
e de água benta.

A tradição diz-nos também que três gotas de água benta bebidas da pia baptismal no domingo de Páscoa «privam do bruxedo», enquanto que, se em silêncio e às escondidas, na noite de Páscoa, as mulheres lavarem o rosto na água de uma fonte ou num ribeiro, conservarão a juventude.

Barro, Jorge e Soledade Martinho Costa (2002), Festas e Tradições Populares: Março e Abril. Lisboa: Círculo de Leitores. 
 


terça-feira, 30 de março de 2010

Alecrim

Alecrim alecrim aos molhos
por causa de ti
choram os meus olhos
ai meu amor
quem te disse a ti
que a flor do monte
era o alecrim

Alecrim alecrim doirado
que nasce no monte
sem ser semeado
ai meu amor
quem te disse a ti
que a flor do monte
era o alecrim

Domingo de Ramos - Benção dos Ramos ou dos palmitos




fotografia de Jorge Barros


Atados com fitas de cores e compostos por folhas de palmeira, alecrim, oliveira, loureiro, rosmaninho e mimosa, os ramos, benzidos antes da missa (ou de véspera, na missa da tarde), guardam-se depois em casa durante todo o ano.
Nas vilas e aldeias são pendurados na cozinha ou à cabeceira da cama, para «proteger a casa dos maus ares».

(...)

Em Estremoz, após o ramo de alecrim ter sido benzido, era tradição as raparigas retirarem-lhe um raminho, que colocavam nas lapelas dos casacos dos namorados, dizendo: «Verde é / Verde cheira / Ficas preso para sexta-feira» - significando que o namorado teria de oferecer-lhe amêndoas.
O rapaz fazia o mesmo com o seu próprio ramo, e dizia: «Verde é / Verde há-de cheirar / Ficas presa para me dar o folar» - o que acontecia no domingo de Páscoa.


Barros, Jorge e Soledade Martinho Costa (2002), Festas e Tradições Populares: Março e Abril. Lisboa: Círculo de Leitores. 

domingo, 21 de março de 2010

João Villaret - Procissão

 

Primavera


Equinócio da Primavera,  20 de Março de 2010, 17:20

"Romeiros das Brumas" - Ilha de São Miguel

(fotografia de Jorge Barros, adaptada)

O culto penitente dos romeiros da Ilha de São Miguel tem a sua origem em 1552, quando um grande tremor abalou Vila Franca do Campo. Nessa altura, um dos habitantes, na sua aflição, terá chamado pela Virgem do Rosário. Todos ficaram sob os escombros, menos aquele.
Em memória desse acontecimento, prometeram depois os açorianos, para louvar a Senhora, organizar anualmente as ramagens, compostas apenas por grupos de homens, a originar uma onda de penitência, oração e verdadeira solidariedade humana.
A volta à ilha, que decorre durante as sete semanas da Quaresma (a começar no primeiro sábado, ou em casos mais raros domingos), inicia-se de madrugada (quatro horas da manhã) e termina no sábado seguinte, à noite, ou no domingo de manhã, perfazendo cada grupo a peregrinação de uma semana - penitência religiosa que se verifica somente em São Miguel.
(1º Sábado de Quaresma, 20.02.2010)

Barro, Jorge e Soledade Martinho Costa (2002), Festas e Tradições Populares: Março e Abril. Lisboa: Círculo de Leitores.

Trigo e gratidão só crescem em boa terra e boa alma.
M.L. 15.03.1937 - 13.02.2010

quarta-feira, 2 de dezembro de 2009

dedicada às moçoilas do Tinto



(fotografia de Jorge Barros)

Pai-nosso do vinho

Santa uva que estais na parreira, 
purificada sejais sem enxofre e sem sulfato.
Venha a nós o vosso líquido
para ser bebido à nossa vontade
tanto na taverna como na nossa casa, 
mas livrai-nos de quebrar a cabeça. 
Ámen!

Festa de Santa Bebiana, em Caria, 2 de Dezembro (considerada pelo povo como a padroeira das mulheres bêbedas)



sábado, 28 de novembro de 2009

Rama

Ó rama, ó que linda rama,
Ó rama da oliveira!
O meu par é o mais lindo
Que anda aqui na roda inteira!


Que anda aqui na roda inteira,
Aqui e em qualquer lugar,
Ó rama, que linda rama,
Ó rama do olival!


Eu gosto muito de ouvir
Cantar a quem aprendeu.
Se houvera quem me ensinara,
Quem aprendia era eu!
 

Não m’invejo de quem tem
Parelhas, éguas e montes;
Só m’invejo de quem bebe
A água em todas as fontes.
 

Fui à fonte beber água,
Encontrei um ramo verde;
Quem o perdeu tinha amores, 

Quem o achou tinha sede.
 

Debaixo da oliveira
Não se pode namorar;
A folha é miudinha,
Deixa passar o luar.


Letra e música: popular; Alentejo.

sexta-feira, 20 de novembro de 2009


No dia de São Martinho, mata o teu porco ...

fotografia de Jorge Barros


... e prova o teu vinho.

fotografia de Jorge Barros




O primeiro

Bebe-se inteiro,
O segundo até ao fundo,
O terceiro é como o primeiro
E o quarto é como o segundo;
O quinto bebe-se todo,
O sexto do mesmo modo,
O sétimo bebe-se cheio;
E o oitavo duas vezes e meio;
E para isto acabar
Vem o nono para atestar.

A castanha tem uma manha, vai com quem a apanha.




Magusto em Marmelete, Monchique
(fotografias de Jorge Barros)

domingo, 15 de novembro de 2009


Há tempo para velar e tempo para descansar...


Culto dos Mortos
(fotografia de Jorge Barros)






Toda a palavra é perdida se de alma não foi ouvida.



Festa das Almas, em Rio de Onor e Babe, Bragança
(fotografia de Jorge Barros)

sábado, 14 de novembro de 2009





[fotografia de autor não identificado]

Nabia/Navia - "dedica a endovellico!"