quarta-feira, 3 de maio de 2017

Nabia - "Ara de Marecos"




"Ara de Marecos"



Achada na Capela de Nossa Senhora do Desterro, em Marecos, Penafiel, Porto.
Encontra-se no Biblioteca-Museu de Penafiel.  Ver ficha epigráfica aqui*

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«Se a ocupação romana de Santarém se fez sentir entre meados do século II a.c. e o século VI, é natural que o panteão divino se tivesse mesclado de deidades pré-romanas, romanas pagãs e romanas cristãs. Assim se explicaria a semelhança entre cultos pré-cristãos, por exemplo ligados a rios e fontes, e cultos cristãos com capelas, igrejas e mosteiros construídos, na maior parte das vezes, sobre antigos templos, anteriores ao cristianismo.
Nabia ou Navia, deusa aquática adorada na Lusitânia, parece ter sido cultuada a 5 de Abril [?], segundo a inscrição numa ara de Marecos* e surge relacionada com nomes de rios e de localidades próximas de ribeiras e nascentes. São exemplos os rios Nábios, Neiva e mesmo Nabia(13), ou a vila de Nava, na Galiza; Nabais e Nabainhos, na Serra da Estrela; Naves, povoação próxima de Envendos, região de nascentes e barragens; ou o rio Nabão, que deu origem a Nabância, a 2 km do que é hoje Tomar. Em Braga, a milenar Fonte do Ídolo, que secou há bem pouco tempo, tem uma pedra com a inscrição “Tongoe Nabiago” que algumas versões apontam como um juramento a Nabia.»

(13) J. M. Blázquez 1983 294: “El rio Nabia gozó de gran culto, a juzgar por el número de dedicatorias. Nabia es palabra que indica corriente de agua y que aparece con diferentes denominaciones”. 

Lina Maria Soares, "Da Scallabis romana a Sanctaren medieval: espaço, gentes e lendas",
AQUI:  CONGRESSO DA ASSOCIAÇÃO PORTUGUESA DE ESTUDOS CLÁSSICO, 7, Évora 2008 - Espaços e paisagens: antiguidade clássica e heranças contemporâneas: Vol.3 História, Arqueologia e Arte. Coimbra


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[...]
«A inscrição de Marecos (Penafiel, Porto), que alude a um sacrifício consagrado a Nabia Corona, “ninfa” (ou divindade protectora) dos Danigi, e a outras divindades, recorda uma cerimónia realizada em 9 de Abril. Ora, não ficando esta data distante da que hoje consideramos a do equinócio da Primavera, poderemos tomar a inscrição de Marecos como argumento a favor da função que atribuímos a Nabia?
Na ara de Marecos, P. Le Roux e A. Tranoy (1974) leram primeiro: O(ptimae) V(irgini) Co(nservatrici), vel Co(rnigera), et Nim(phae) Danigom Nabiae Coronae. Depois, P. Le Roux (1994: 561) sugeriu O(mnia) v(ota) co(nsagro) et nim(bifero) Danigo m(acto) Nabiae Coronae, traduzindo: “Consagro-vos todas estas oferendas e, por Danigo, que dispensa a chuva, sacrifico a Nabia Corona”.
A primeira restituição, “À excelente virgem conservadora (ou cornuda) e ninfa dos Danigos”, parece-nos preferível.
A inscrição começaria pela invocação da divindade, com seus epítetos. Segue-se a indicação dos animais oferecidos: à própria deusa javascript:void(0); Nabia (agora nomeada sem epítetos), a Júpiter, a uma outra divindade [...]urgo e a Ida (ou Lida). Estando atestado o epíteto Idunica ou Idennica com o sentido de “a que gera ou dá à luz” (OLMSTED, 1994: 157), esta divindade a que se oferece um cordeiro seria, talvez, deusa que se invocaria para favorecer o parto dos animais. Na inscrição, os animais oferecidos parecem preceder os teónimos.
Perséfone é por vezes, na Grécia, designada apenas como Korê, “virgem” ou “rapariga”. Não surpreende, pois, que Nabia leve este nome de “virgem” na ara de Marecos.»

Jorge de Alarcão, "A religião de lusitanos e calaicos"
DAQUI: Conimbriga XLVIII (2009) p. 81-121


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Para outra interpretação da Ara de Marecos (Nabia: divindade de culto agrário)
Artigo sem autor. Ver aqui: http://revistas.ucm.es/index.php/HIEP/article/viewFile/HIEP9696110381A/30467
Revista - Hispania Epigraphica, volume 6 (2000)

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